Cores - criação e revelação de Deus na paisagem
De tudo que se estudou se estuda ou se estudará a respeito de Deus, uma
coisa é certa: Deus é... um mistério.
Tomemos os sons(*) como objeto de estudo, em suas variações da fala, da música nas expressões humanas. Por exemplo: na
fala hebraica, sussurros materializam letras (como hê, hêt); na música árabe,
tons, semitons, e menores fragmentações ainda, compõem uma melodia; em cantos
indígenas, a perfeita sintonia entre ritmo e síncope conduz um coro acurado e
preciso. De modo que, para nossa percepção ocidental e/ou urbana, não raro
carente de empatia cosmopolita (global e inclusiva), há elementos que a nós
tornam essas expressões sonoras... um mistério.
Consideremos, por um instante, a Bíblia(*): alguns dos diferentes contextos
históricos e sociais das narrativas ali registadas; o pensamento hebraico
versus o nosso, com as relevantes diferenças de raciocínio e compreensão; a
cultura oriental, diametralmente distante da nossa. Nesse ínterim, toda manifestação
comportamental e geograficamente apartada de nosso próprio contexto é, para
nossa formação,... um mistério.
Observemos, agora, o nosso ambiente(*), nosso entorno, o lugar onde
vivemos: a linha de educação escolhida pela família do vizinho; os hábitos dos
colegas de estudo ou trabalho; a fé adotada e proclamada por nossos familiares
e amigos. Em cada uma dessas circunstâncias há escolhas e ações praticadas as
quais, diante de nossas convicções e crenças, são... um mistério.
Então, sendo tudo uma questão de referências e perspectivas, quando é que algo deixa de ser mistério?(*)
Muito se tem buscado entender mais sobre a natureza das coisas, sobre a origem da vida e, primordialmente, sobre a essência de Deus. Quanto às coisas, há um certo consenso. Quanto à origem da vida, há um antagonismo imenso. Quanto a Deus, um multinômio pretenso.
Nessa infinidade de possibilidades de compreensão, separo aqui duas analogias que intentam explicar, chegar perto do que seja a essência de Deus como Ser Único, ao mesmo tempo que triplamente personificado.
Primeira analogia: água, em seus três estados físicos básicos - sólido, líquido e gasoso(*).
Segunda analogia: ar, em seus três estágios básicos de movimento e
intensidade - brisa, vento moderado e tempestade(*).
Peço licença para discordar de ambas. Motivo: falta de simultaneidade.
Ou seja, para que os estados físicos da água e os estágios de movimento e
intensidade do ar aconteçam, três condições ambientais diferentes e não
simultâneas precisam ocorrer. Ao passo que, tratando-se de Deus, Único e
Triúno, as três Pessoas relacionam-Se, coexistem simultaneamente,
insubordinadamente e independentemente de condições e barreiras de qualquer
natureza. E isso é, precisamente, a onipresença de Deus que, aliada à onisciência
e onipotência, constitui alguns de Seus atributos e faz parte de Sua essência magnífica, tanto quanto misteriosa;
soberana, tanto quanto amorosa.
Daí voltamos à pergunta: quando é que algo deixa de ser mistério?
Resposta: quando é plenamente desvendado. Por conseguinte, Deus será mistério
até que seja totalmente desvendado. E quando Deus será totalmente desvendado?
Ele mesmo, por meio do sábio, responde essa: "... a vereda dos justos é
como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito."
ou "O caminho do homem justo fica cada vez mais claro à medida que ele
avança, como quando o sol aparece e o dia vai ficando mais claro". Essas
duas versões de Provérbios 4:18 (ARA e Bíblia Viva) discorrem bem sobre nossa
caminhada de aprendizagem durante a vida e sobre a vida. Na verdade, do termo
"luz da aurora" ou "sol que aparece", fica outra pergunta:
em que ponto se dá o "dia perfeito", o ápice do "dia ficando
mais claro"? O que se percebe é que sobre as coisas e sobre algo da
própria vida podemos até ter alguns estudos concluídos. Tratando-se de Deus, no entanto, ainda não nos formamos nessa escola. Ouso dizer que jamais nos formaremos nela. Não por incapacidade nossa de aprender, mas por inesgotabilidade de Deus em desejar, em se deleitar, em amar Se relacionar conosco.
Compilando as ideias e avançando:
- Deus é um mistério. Ok.
- Deus é amor. Ok.
- o amor se revela em relacionamentos. Ok.
Portanto:
- Deus é um mistério
relacional. Um mistério relacional que ocorre nas alturas, no Céu dos céus (interage
entre Si mesmo, e com as criaturas celestiais), e que também se inclina para a Terra (interage conosco).
Assim sendo, como melhor compreender a essência relacional de um Deus
que é Único, Triúno e acessível? Se não água... Se não ar... O que pode ser? Há
como chegar mais perto de revelar esse mistério?
Bom, não custa tentar: (vermelho + azul + amarelo) = (?) Cores? Certo. Mas há muito
mais nessa fórmula. Por ora, sigamos nesse caminho, já que aprendemos que ele
vai clarear ainda mais enquanto andamos. Sabe aquele disco de cores(*) que
aprendíamos na escola, dividido pelas cores primárias, depois as secundárias, e
com um eixo no meio para que o disco girasse? Pois é! O que acontecia quando
era girado? Tudo banquinho, branquinho... as cores sumiam! Melhor, se
"relacionavam” tão perfeitamente que se tornavam uma só, o branco. Pelo
menos, aparentemente. Na realidade, as cores protagonistas ainda estavam lá, em
individualidade e essência. Atuando de forma tão intensa e harmônica que nossa
percepção limitada não as podia distinguir, apenas contemplar o resultado.
Aprimorando a fórmula: (vermelho + azul+ amarelo) = (luz). Aquela
"luz da aurora", o "sol que aparece", de Provérbios 4:18,
lembra? E luz é a união de todas as cores. Podemos visualizar esse fenômeno
durante a dispersão da luz ao passar por um prisma(*) de vidro ou num chuvisco,
por exemplo, difundindo as cores do arco-íris. Podemos notar a diversidade de
manifestação do espectro de cores no período do dia, entre o amanhecer
(amareladas, alaranjadas e avermelhadas, que vemos, e azuis e violetas, que não
vemos), passando pela metade da parte clara do dia (azuis, que vemos, e
violetas, amareladas, alaranjadas e avermelhadas, que não vemos) e terminando
com o entardecer (amareladas, alaranjadas e avermelhadas, que vemos, e azuis e
violetas, que não vemos). Só porque não vemos algumas das cores, não quer dizer
que não estejam lá.
De modo semelhante, Deus atua no que vemos e no que não vemos. De um jeito ou de outro, Ele está lá. E é intrigante o fato de que as cores, assim como Deus, estão presentes de forma simultânea na natureza, em todo o lugar e ao mesmo tempo. Com seus tons primários ou em matizes, todas as composições são possíveis às cores. As alternativas de combinações não se esgotam, ao contrário, se multiplicam e se concretizam em novas e surpreendentes nuances. Acreditamos ter encontrado uma preferência absoluta, só para logo em seguida ficarmos encantados, maravilhados com um novo arranjo ainda mais belo.
Analogamente ao que acontece em relação às cores, precisamos de uma superfície dispersora tanto para enxergar os mistérios da essência divina e, ao menos em parte, compreendê-los, quanto para compartilharmos com outras pessoas o entendimento até então alcançado. Dessas interações, se devidamente filtradas por uma superfície dispersora idônea, resultam as convergências harmônicas dos relacionamentos. Do contrário, surgem os conflitos.
Eis porque é tão necessário mantermos um filtro imparcial, equilibrado diante de qualquer empreendimento que nos propusermos realizar. Para que apreciemos todas as cores, até as que não vemos; para que registremos todos os sons, até os que não reconhecemos; desfrutemos de todos os cantos, ainda que os não decifremos; admiremos todas as culturas, sobremaneira as que não assimilamos; desculpemos todas as faltas, inclusive as que não reconhecemos; honremos todas as crenças, ainda que delas não compartilhemos; adoremos o Deus em quem cremos, a despeito do quanto sobre Ele nós já (ou ainda não) sabemos.
Sim, Deus, que é mistério, é amor. E amor com muita, mas muita cor, já que é Ele a própria Luz e também o Dispersor.
Por fim, cores parecem mesmo ser um bom dispositivo de estudo da essência de um Deus Eterno, Único e Triúno. São uma imensurável oportunidade de, a partir delas, ampliar a perspectiva e alargar as fronteiras do conhecimento pela vereda da vida e pelo tempo que houver Luz. Quanto tempo? Eternamente. Alguém arrisca outro palpite?
SJ
(*) Fonte das imagens: Internet